FOTO: Lícia Maia |
Assim que estacionamos
na primeira parada sentimos um leve cheiro de queimado saindo do carro. Nada
demais, era só o motor. Continuamos.
Antes de entrar na
trilha um alongamento. Braço pra cá, perna pra lá, uns pulinhos. Pergunto a
Neyson Nascimento, nosso condutor de trilha, o por quê do alongamento. Ele me
responde que antes de longas caminhadas temos que preparar nosso corpo,
principalmente quando há subidas. Chapéu na cabeça e muito protetor solar.
Começamos nossa trilha.
Logo no início, como uma
boa medrosa, pergunto se há algum bicho selvagem do tipo cobra, onça ou gato do
mato. Ele me responde que sim, e até já viu uma raposa naquele mesmo local em
que passávamos, porém esses animais se assustam com as pessoas e acabam ficando
longe das trilhas. Seria muito difícil vermos algum por ali, para minha
alegria.
A pedra do morcego foi ponto estratégico e refúgio de cangaceiros. FOTO: Lícia Maia |
Algumas descidas
escorregadias, nada demais. O guia sempre nos recomendava que andássemos de
lado, pois conseguiríamos mais apoio caso deslizássemos. Alguém que teimava
logo levava um susto, escorregando, só para acordar.
Paramos na primeira
fonte, onde ele nos explicou algumas regras básicas que todos os frequentadores
do local deveriam seguir: leve apenas lembranças, deixe apenas pegadas, tire
apenas fotos e queime apenas calorias. Nada de jogar lixo no chão. Tomar banho
nas águas das fontes também não, apesar de que em todas que paramos, sem
exceção, havia gente.
Pergunto o por quê de
tanta desobediência, pois além das pessoas sujando – tomando banho – naquelas
águas que servem para abastecer à comunidade encontramos muito lixo espalhado
pela trilha. Ele diz que, além da falta de educação das pessoas, não há
regulamentação, qualquer um entra mesmo estando sem condutor, leva bebidas, faz
fogueiras, deixa lixo e suja as águas. Em todas as fontes Neyson reforçava o
que não se podia fazer, mesmo com várias pessoas ao nosso lado dentro d’água.
É importante lembrar
também que o costume que temos de pensar que todo alimento orgânico é adubo lá
não serve. Qualquer semente, casca ou fruta que não for nativa do local, se
jogada no chão, pode mudar completamente a lógica das plantas.
A importância do guia
Comprovei na própria trilha a importância do guia. No Riacho do
Meio tudo era bem demarcado, sinalizado e explicado. Muitas placas. Apesar
disso tropeçamos com um grupo de jovens que vinha gritando o nome de uma amiga
perdida. Gritavam incessantemente, comentando entre si que ela sabia que tinha
que ficar próxima deles.
Além disso, o nosso guia
explica que em toda trilha, por mais organizada que seja, podem ocorrer
imprevistos. Uma picada de animal venenoso, uma queda, um tornozelo torcido ou
até algo pior. Ele me conta que nas trilhas que conduziu nunca passou por
algo do tipo, porém já viu uma queda feia. Ele me leva no local do
ocorrido, dizendo que quando foi socorrer, a pessoa já estava se
levantando, havia batido a cabeça, mas a graça da queda era maior que a dor,
saia rindo de si mesma.
O preço médio de um guia
é de R$200 e, se o número de pessoas for maior que vinte, o valor se torna R$20
por trilheiro. Um valor mínimo quando se lembra da segurança.
No total foram quatro
locais visitados no Riacho do Meio: duas bicas e dois poços feitos pela
comunidade. A primeira bica foi a das pedras, a segunda a da nascente do olho
d’água branca (nome em referência à cor que a água fica quando as pessoas tomam
banho lá).
Entre uma fonte e outra
passamos pela pedra da coruja, onde está esculpido algo parecido com o rosto de
um índio.
Logo depois dela a pedra do morcego, alta e de
vista ampla. Lugar de refúgio do bando dos Marcelinos na época do cangaço.
Alguns ficavam em cima dela e avisavam com um tiro aos de baixo quando a
Volante chegava.
Questão de sorte
O Soldadinho do Araripe
é um pássaro endêmico da floresta do Araripe, ou seja, só aqui você o encontra
– mas nem sempre o vê. Durante a trilha paramos algumas vezes para ouvir seu
canto. É difícil vê-lo pelas redondezas, pois além de pequenino se esconde.
Sorte nossa vimos vários, uma fêmea e alguns machos voando de
galho em galho, até bem próximo de algumas pessoas que estavam lá. Era época de
acasalamento. Depois de algum tempo admirando sua beleza foi que percebemos
quão sortudos fomos. Várias pessoas passam dias inteiros e não conseguem
vê-los.
O guia nos diz que essa
aproximação significa que os pássaros estão se acostumando com as pessoas, e
que aquilo pode ser uma forma de demarcação de território diante dos humanos
que invadem sua floresta. Além do soldadinho do
Araripe há outra espécie endêmica do local, arbórea, a Samambaiaçú.
Como o dia ainda estava
na metade e a fome apertava para o almoço, paramos depois da nascente do Crato
pra comer um peixe frito. Uma ladeira bem inclinada fez a gente lembrar o
porquê de ter alongado: o carro não subiu, mas nós sim. Depois de algumas tentativas
desistimos e deixamos o carro na nascente mesmo, duas ladeira a mais uma a menos, qual diferença fazia naquela altura da tarde?
Depois da barriga
forrada seguimos para o mirante, e não deu outra. De novo o carro fez gracinha
com a gente. Estava ficando tarde e, por segurança, resolvemos deixar a Trilha
do Picoto para lá. Seguimos para a bica da borboleta.
Mais ladeiras, e haja
perna! No caminho um dos trilheiros resolve revelar ao condutor que é cardíaco
– depois disso tudo é que você vem dizer?- falou Neyson abismado.
Levou-me a perguntar se havia impedimentos para alguns tipos de doenças. Ele me explica que quem tem problemas no joelho, por exemplo, deve evitar longas caminhadas, já quem tem problemas de coração deve evitar grandes esforços. Já era tarde.
A partir dos quatros
anos as crianças já podem fazer trilhas (que não exijam tanto delas) e não há
idade máxima, contanto que você respeite seus limites e as advertências do
condutor e do seu médico. Neyson conta que a maior parte das pessoas que o
procuram tem entre 19 e 30 anos.
Ele também recomenda o
uso de roupas de academia nas trilhas. Tênis, bonés ou chapéus, muita água e
protetor solar. Também é bom levar frutas, que alimentam e hidratam.
Estávamos no sopé da
Chapada do Araripe, no Geossítio Rio da Batateira. A conversa ajudou na subida
da primeira ladeira, mas ela não era a única. Entramos num caminho de terra
estreito. Como já era fim de tarde e as árvores faziam mata fechada não se via muita
coisa e o escuro só aumentava. Notando nossa dificuldade, o condutor amarrou uma corda a sua cintura, distribuindo-a na fila indiana em que nos
encontrávamos, para nosso apoio, e foi na frente.
Passamos pelo Tanque dos
Malucos, uma espécie de cacimbão com 30 metros de profundidade. Neyson conta
que antigamente aquele local era cheio d’água e as pessoas entravam para tomar
banho. Realmente só um louco para aceitar tal desafio.
Pedra da batateira
Pelo caminho conhecemos também a famosa pedra da batateira, que
guarda uma das fontes do local.
Reza a lenda que a pedra
da batateira é amarrada com um fio de cabelo de Nossa Senhora, e quando esse
fio quebrar a pedra vai se soltar e rolar, inundando o Crato e acordando a
baleia que está adormecida na Praça da Sé.
Depois de alguns minutos
de caminhada chegamos à bica a borboleta. Lá sim pode tomar banho à vontade.
Apesar de aquela fonte abastecer a comunidade, a bica não o faz, servindo
apenas para o deleite de quem anda por ali. Já eram mais de cinco da tarde, não
víamos muita coisa, mas para relaxar só era preciso sentir a água batendo no
corpo.
Não queríamos ter de ir,
mas já era a “hora das cobras” segundo nosso condutor.
Justamente naquela hora que as cobras saiam de seus ninhos para
andar pertinho de nós. Mesmo adorando aquele banho de bica o aviso serviu para
nos apressar.
A volta teve um
pouquinho mais de adrenalina, claro, pois podíamos ver uma cobra a qualquer
momento. Ainda bem que era feriado e elas resolveram sair mais tarde, não vimos
nenhuma.
Na volta as luzes da
cidade já estavam acesas. Sentimos bem a diferença de climas enquanto descíamos
a serra, de agradável a muito quente em instantes. O que nos restava era voltar
para casa com aquelas belas lembranças de um Cariri natural.
Para ganhar o céu
Para quem já está
acostumado com trilhas ou só deseja algo mais radical, em Juazeiro do Norte, na
rampa do horto, há saltos de parapente.
Para o salto é preciso
apenas duas coisas: coragem e um bom vento. Segundo Absalão Maia, que fez voos
duplos, nem sempre o vento está para salto. Há dias em que está muito forte e
há dias em que está muito fraco. Nesse último só dá para fazer um voo rápido, pousando
em baixo da serra, o voo prego – em dias de ventos bons o salto termina no
local que começou.
Como não podia ser diferente, a repórter também saltou. No
começo os equipamentos de segurança e recomendações: fui de calça, tênis e
ajustei o capacete que o instrutor me deu. Tudo pronto, o cliente vai na
frente, numa espécie de cadeira, e o instrutor logo atrás, nas rédeas do
parapente.
Passamos alguns minutos
para saltar, Absalão explica que tem de sentir como o vento está antes de ir.
Andamos para um lado e para o outro, quase saindo do chão e ficando na ponta
dos pés, mas ainda sem levantar voo.
Quando chega a hora a
instrução dele é para eu correr, mas cadê a coragem? Um amigo do instrutor, que
nos ajudava, arrastou-nos e empurrou-nos abismo abaixo. 180 metros de altura.
No começo a única reação foi fechar os olhos, mas depois comprovei o que
Absalão, com seus seis anos de voo, me disse: lá em cima é tranquilo.
Olhando para baixo uma
visão magnífica, as árvores e pessoas bem pequeninas e atrás de nós um por do
sol belíssimo. O vento não estava bom, então duramos pouco. Logo na metade do
caminho até embaixo ele me apontou onde íamos pousar. Como você sabe? –
pergunto – experiência, ele me responde.
A sensação é realmente incrível. Uma paz de espírito misturada
com adrenalina. Para quem tem medo de altura é como libertar-se. É algo que
todos um dia deveriam tentar: ganhar o céu nem que só por cinco minutos.
Pôr
do sol
Se você estiver afim apenas de relaxar e curtir uma paisagem
bonita, a Pedra dos Ventos no horto de Juazeiro é um lugar perfeito. De um lado
é possível apreciar o pôr do sol, do
outro o seu nascer. De tardezinha também dá para ver as luzes da cidade
acendendo-se. É um ótimo lugar para jogar conversa fora com os amigos ou simplesmente apreciar a vista e sentir a natureza. (Portal
Badalo)
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