Morrinhos fica apenas a 1km da mina de onde se pretende extrair
urânio, e tem a maioria da população de agricultores. FOTO: Kid Júnior
O dragão adormecido debaixo da montanha. É assim que a população de Morrinhos se refere à mina de urânio em Santa Quitéria. Promessa de emprego e renda, o projeto que deve ser reativado nos próximos anos é também motivo de desconfiança. 

Expectativa de mais de 2,5 mil empregos ao longo da construção e também do funcionamento, a exploração de urânio e fosfato planejada pelas Indústrias Nucleares do Brasil e a Galvani desperta também incertezas. 

Os habitantes do assentamento a 4 quilômetros de distância da mina temem desde os riscos de saúde que podem ser trazidos pela exploração até o receio de que os produtos agrícolas cultivados na região fiquem “encalhados”, sem encontrar compradores seguros de que não há altas taxas de radiação nos grãos ou nos animais dali. 

Agricultor, Antônio Tomás, de 49 anos, contou que não quer chegar nem perto da mina, nem deixar os filhos trabalharem no local. O maior medo, ele explicou: é a contaminação por radiação. 

“Temos medo de radiação. Hoje, a gente peleja para fugir dos problemas. A expectativa minha é de que isso não seja explorado nunca. Eu não posso colocar o dinheiro na frente da minha vida, da minha comunidade. Se eles chamarem a gente para trabalhar lá, mesmo com uma diária de R$ 200, eu fico em casa, comendo meu feijão batido com arroz. Eu não vou, nem deixo meus filhos irem”, garantiu. 

Mas a relação com a mina nem sempre foi assim, permeada pelo medo de que “o dragão” pudesse acordar. Antônio lembrou de que há cerca de 20 anos, em uma das várias ocasiões que a mina foi anunciada, ele vibrou. “Era uma festa. Eu dancei e rodei lá no salão, quando um dos políticos da época anunciou que a mina ia trazer emprego e renda pra nós”, relembrou. 

As coisas começaram a mudar quando o assentamento de Morrinhos passou a receber visitas de cientistas da Universidade Federal do Ceará (UFC) e moradores de outras cidades que passaram por processos semelhantes, como Caetité, na Bahia. 

Apontando os riscos 
“Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”, recitou Antônio. A passagem bíblica, contou, retrata bem a realidade da comunidade. Segundo ele, não havia sequer a ideia de que o urânio pudesse oferecer riscos como radiação. Só a partir das discussões foi que ele e os outros moradores da região conectaram os riscos expostos pelos cientistas aos vários casos de câncer já registrados ao longo dos anos por ali. “Todo mundo aqui tem uma pessoa próxima que já foi levada pelo câncer”, lamentou. 

Teoria reforçada pelo também agricultor Francisco Tomé, 64. Em uma das lembranças que tem relacionadas à mina, ele contou que o velório de um dos amigos próximos assustou os presentes. 

“A gente encostava o dedo dele na parede e a pela ia saindo aos poucos. Morreu de câncer. O câncer, você sabe que dá em todo canto, mas na nossa região é muito intenso. Só que não tem algo que confirme, como uma avaliação do Ministério da Saúde, que a razão é a radiação”, falou.

(Fonte: Diário do Nordeste)

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