Foto: AFP

Um ano após a confirmação dos primeiros casos de coronavírus no Ceará, o Estado vive um dos momentos mais críticos da pandemia, batendo recorde de casos confirmados e com altas taxas de ocupação de leitos de UTIs e enfermarias. No dia 1º de março de 2021, 4.688 cearenses positivaram para a doença, o que representa mais de mil casos em relação ao pico de 2020, quando esse número chegou a máxima de 3.507, em 1º de junho. 

A grande quantidade de casos em investigação alerta para a possibilidade dos números atuais serem ainda mais elevados. O registro do primeiro dia de março, por exemplo, pode ser superior se outras 2.156 notificações forem confirmadas. Vale ressaltar ainda que em oito desses primeiros 20 dias de março essas confirmações ultrapassaram a faixa de 3 mil, número que entre maio e julho de 2020 se restringiu a seis dias. Os dados estão disponíveis na plataforma IntegraSUS.

A epidemiologista Daniele Queiroz atribui essa elevação a quatro fatores principais: a dinâmica de transmissão do vírus, que prevê esses picos em diferentes ondas; a chegada de uma nova variante, provocando inclusive reinfecções; a interação entre as pessoas que aconteceu nas festas de fim de ano e no Carnaval; e a não adesão, por parte da população, às medidas de restrição recomendadas pelo Governo do Estado.

“Nós estamos vendo hoje o reflexo de evolução de casos graves e as mortes decorrentes disso, de um cenário epidemiológico de alta transmissão de um mês atrás. Se a gente for considerar que o paciente se expõe, tem o período de incubação mais o período em que ele agrava, isso dá cerca de 10 a 15 dias; mais 15, 20, 25 dias de internação até a alta ou a evolução para morte, isso dura cerca de um mês. Então, hoje, a gente tem leitos de UTI ocupados pela grande ocorrência de casos de janeiro e meados de fevereiro ainda, com certeza”, analisa Daniele Queiroz.

Para a epidemiologista, o aumento de testes rápidos feitos em farmácia não diminui ou iguala o pico atual em relação a 2020. “Isso não está atrelado ao aumento de testagens, porque muitas pessoas, infelizmente, nem entram para o sistema. A gente sabe que o número que é anunciado ali pelos serviços de saúde é uma mostra do que acontece na realidade”, observa.

EFEITOS DO LOCKDOWN
Por outro lado, desde que o isolamento rígido foi proposto pelo Governo Estadual, em 5 de março, uma queda da curva de casos confirmados no IntegraSUS é perceptível, mesmo com algumas oscilações. Nos últimos cinco dias, por exemplo, as confirmações já ficam abaixo de mil, ainda que casos em investigação possam elevar esses números.

“Isso pode, sim, ser reflexo da medida restritiva, embora essa velocidade de diminuição poderia ter sido maior se as pessoas tivessem aderido mais a essas três semanas ao lockdown”, avalia a epidemiologista.

“O lockdown vai agir exatamente para isso, para que a gente possa reduzir a velocidade de transmissão e para que os serviços de saúde se organizem para receber essa demanda crescente”, observa.
Neste sentido, Daniele chama atenção para as taxas de ocupação de UTI e enfermaria, que seguem altas, com mais de 90% e 80%, respectivamente, mesmo com a abertura de novos leitos em 2021. Preocupa a imensa fila de espera por vagas na UTI, com 481 pacientes no Estado, sendo 259 só em Fortaleza.

“Nesse momento crítico, de colapso mesmo, porque apesar da redução de casos, a gente ainda não consegue ver redução de ocupação de taxas de leitos de UTI, o tempo (do lockdown) ainda não foi suficiente”, afirma, em diálogo com a prorrogação do decreto de isolamento rígido feito pelo Governador na noite de sexta-feira (19).

CONTROLE DE ÓBITOS
O único número que ainda permanece abaixo dos registros de 2020 nesta segunda onda aqui no Ceará é o de óbitos. Se em maio do ano passado, chegamos a mais de 100 mortes por dia em decorrência do vírus, em março deste ano o máximo foi de 80 óbitos confirmados, no dia 7.

Daniele justifica esse cenário por dois fatores principais:  “Já temos um ano de experiência clínica sobre como tratar a doença, e a construção de um protocolo de manejo clínico do paciente impacta; e é importante frisar que durante esses 2 meses e meio do ano de 2021, a gente não sofreu com desabastecimento de qualquer insumo que possa interferir no tratamento dos pacientes graves, e também não tivemos uma crise tão grande como Amazonas teve por falta de oxigênio”.

Segundo a epidemiologista, ainda são esperados alguns óbitos nas próximas semanas decorrentes desse pico, mas, depois, a tendência é uma redução das mortes. “A taxa vai diminuir quando diminuir a exposição. No momento que voltar a ter exposição, infelizmente, vai voltar a ter alta taxa de ocupação de UTI”, explica Daniele.

“O que poderia nos salvar disso tudo, e a gente vem debatendo muito, é a vacinação em massa, aumentar a velocidade da vacinação, mas enquanto isso não acontece, é fazer as medidas de prevenção individual. E quem puder, fique em casa, porque esse momento é muito crítico”, alerta, por fim, destacando o colapso em âmbito nacional.

(Fonte: Diário do Nordeste)

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