Desde 2019, o Ubirajara jubatus virou símbolo da luta por repatriação de fósseis, engajada na internet pela hashtag UbirajaraBelongsToBR.(foto: Bob Nicholls / Paleocreations.com 2020)

Paleontólogos de instituições brasileiras e alemãs publicaram uma carta evidenciando as consequências do tráfico de fósseis e a importância da repatriação dos materiais aos países de origem. O artigo foi publicado na revista científica Nature Ecology & Evolution nesta segunda-feira, 15 de novembro, e usa o caso do Ubirajara jubatus como exemplo.

O fóssil do Ubirajara foi retirado do Brasil, na bacia do Cariri, em 1995, levado então para o Museu Estadual de História Natural Karlsruhe (SMNK). Em 2019, uma equipe de paleontólogos do Reino Unido, Alemanha e México publicaram a descrição da nova espécie, levantando questionamentos dos brasileiros sobre como o fóssil chegou à Alemanha. Mais tarde, descobriu-se que os documentos de exportação apresentados eram insuficientes de acordo com a legislação brasileira.

Na carta publicada na Nature, os paleontólogos Aline Ghilardi (UFRN), Juan Cisneros (UFPI), Nussaïbah Raja (Universidade de Erlangen-Nuremberga, da Alemanha) e o pesquisador de Direito Internacional, Paul Stewens (Alemanha) destacam que o tráfico de fósseis costumeiramente favorece países do hemisfério norte em detrimento dos países do hemisfério sul. Um exemplo é o interesse turístico que os materiais despertam, alimentando a economia dos países do norte, mas sem retorno algum para os do sul.

Além disso, os pesquisadores destacam como os países beneficiários do tráfico — no caso do Ubirajara, a Alemanha — utilizam de artifícios legais próprios para recusar a repatriação dos fósseis. No Brasil, a compra e retirada de fósseis sem as devidas autorizações é ilegal desde 1942, legislação reforçada por outro decreto de 1990. Apesar disso, a Alemanha usou de uma lei própria para afirmar que está isenta de devolver fósseis importados antes de 2007.

Fóssil de dinossauro no centro de uma disputa entre Brasil e Alemanha. (Foto: Divulgação)

“Opor-se à repatriação de um fóssil que foi provavelmente removido ilegalmente de seu país de origem também pode ter um impacto negativo em como casos futuros semelhantes serão considerados”, alerta a carta. 

“Trabalhar com parceiros locais de acordo com padrões éticos faria destas leis e regulamentos mais fáceis de navegar”, pontuam, destacando que muito dificilmente as pesquisas com fósseis do hemisfério sul têm participações de pesquisadores do país de origem — em alguns casos, como no Brasil, um requerimento ético para descrição de novas espécies.

De acordo com os autores, “a repatriação oferece um espaço para começar a corrigir injustiças passadas, e a vontade de discutir tais questões pode levar ao estabelecimento de relações positivas com a comunidade de origem”.

Eles finalizam: “Isso não é apenas uma oportunidade para os museus que mantêm atitudes coloniais e artefatos saqueados para repensar o contexto nos quais esses itens foram adquiridos, mas também para a comunidade paleontológica mais ampla refletir sobre os atuais desequilíbrios de poder que nossa disciplina ajuda a perpetuar.”

Fonte: O Povo

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