FOTO: José Leomar

Ir à escola ou ao trabalho gripado, tossir sem cobrir a boca, chegar em casa e se jogar no sofá sem banho. O que antes da pandemia parecia “normal” hoje é impensável, e essa mudança foi determinante para prevenir doenças além da Covid-19, como a influenza A H1N1.

Em 2021, o Ceará não registrou casos da virose, conhecida também como “gripe suína”, responsável por causar uma pandemia em 2009. Naquele ano, a primeira confirmação da doença no Estado ocorreu em junho, e mais de 200 casos graves foram identificados.

Desde então, 2021 é, até agora, o primeiro ano sem casos. Em nota, a Secretaria Estadual da Saúde (Sesa) informou que “a rede de vigilância sentinela da Síndrome Gripal (SG) atua na pesquisa de múltiplos patógenos, e ampliou a identificação dos vírus respiratórios”, tendo reiniciado as atividades em abril deste ano.

A Pasta confirma que, até a primeira semana de dezembro, não houve registros de casos de influenza A H1N1. “A circulação dos vírus foi reduzida devido às medidas de prevenção para doenças respiratórias adotadas durante a pandemia de covid-19”, explica.

Ainda segundo a secretaria, o Ceará somou 244 casos da gripe H1N1 em 2019, e somente 37 infecções foram confirmadas em 2020, primeiro ano de pandemia no Estado.

O Ministério da Saúde, por outro lado, anota os registros da doença em casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) desde 2009, ano pandêmico. Dados tabulados pelo Diário do Nordeste mostram que o Ceará teve, em média, 225 casos por ano, desde a pandemia.

Os registros são mais precisos desde 2018, ano em que o agente etiológico – ou seja, o tipo de vírus causador da doença – passou a ser especificado. De lá até 2020, então, 432 cearenses tiveram a forma grave da influenza A H1N1, e 80 morreram pela doença.

Por que não houve casos
A epidemiologista Daniele Queiroz pontua que a redução dos casos de H1N1 se deu no mundo inteiro, mas que os vírus influenza A H3N2 e influenza B-Victoria “estão circulando com mais força”.

“A vigilância da Covid e da gripe é integrada. Se não foi registrado caso de influenza, é porque não tivemos o vírus circulando. Mas é importante acrescentar que o Vírus Sincicial Respiratório, também grave, é o que mais está sendo detectado”, destaca Daniele.

A especialista acrescenta ainda que é preciso cautela e manutenção das medidas sanitárias, já que quando há baixa circulação de um vírus num período, a tendência é de que, no seguinte, mais pessoas estejam suscetíveis a ele.

Paulo Magalhães, médico de família e comunidade e mestre em Saúde Coletiva, estima que outras doenças respiratórias, a exemplo da influenza, devem interferir no cenário sanitário de Fortaleza e do Estado, nos próximos meses.

“O Brasil tem excelentes campanhas de vacinação, com bastante capilaridade, mas com toda a energia canalizada para a vacinação contra a Covid, houve uma falha na cobertura vacinal contra a influenza, tanto das crianças como de adolescentes, adultos e idosos”, lamenta.

“Infecção mista”
Caroline Gurgel, virologista, epidemiologista e professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), acredita que o vírus circulou, sim, no Ceará, neste ano, mas que o foco na vigilância da Covid impediu a identificação.

“Se não há uma rede sentinela funcionando para captar outros vírus respiratórios, há uma supressão de informação. Tem circulação, mas não tem o exame que confirme. É impossível identificar o agente de infecções respiratórias só pelos sintomas”, avalia a virologista.

Outro ponto que pode ter contribuído para uma possível subnotificação, lembra Caroline, é que muitos pacientes que acreditaram estar com Covid não fizeram teste, “podendo estar, na verdade, infectados por outro agente, como o influenza”.

O “foco na Covid”, como cita a epidemiologista, gera ainda outro problema. “Existe a chamada para tomar a vacina anualmente, mas as pessoas não estão procurando, porque o foco agora é a Covid. Mas a influenza também pode cursar grave, é preciso se imunizar”, alerta.

Em 2020, conforme a Sesa, o Ceará alcançou 97% de cobertura vacinal contra a gripe entre os grupos prioritários. Em 2019, 95% da meta de imunização foram atingidos.

Neste ano, A primeira etapa da vacinação (abril a maio) alcançou 62% da cobertura de crianças (6 meses a menores de 6 anos), gestantes, puérperas, povos indígenas e trabalhadores da saúde. Na segunda etapa (maio a junho), para idosos e professores, 43% da meta foram alcançados.

Por que a influenza não deixa de circular mesmo com vacina?
O infectologista Keny Colares também reforça a importância da imunização contra a gripe, intensificada no Ceará desde a pandemia, em 2009. “Nesse momento, a vacina não está disponível, porque chega em abril e acaba em agosto, setembro. Então, é preciso reforçar os cuidados que já conhecemos”, pontua.

O médico orienta ainda que “se apresentar qualquer sintoma respiratório, a pessoa não deve ir trabalhar, estudar ou ter contato com outras: deve fazer o teste de Covid. Precisamos estar preparados para o possível aumento dos casos”.

Em 2022, os casos de síndromes gripais (SG) e respiratórias agudas graves (SRAG) por vírus influenza devem crescer em todo o País, como projeta Marcelo Gomes, coordenador do InfoGripe, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

As medidas são as já praticadas desde março de 2020 no Ceará. “Continuar usando a máscara, preferencialmente PFF2; evitar aglomerações, reduzir a quantidade de pessoas nos encontros, evitar ficar em locais fechados. Temos isso claro por causa da Covid, mas a forma de prevenir é justamente a mesma da influenza”, frisa Marcelo.

Fonte: Diário do Nordeste

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