Manter-se o mês inteiro com R$ 400 ou menos soa impossível para a classe média, mas é a realidade de muitos cearenses. Outros milhares sequer têm essa quantia: no Ceará, quase 137 mil famílias ainda estão na fila para receber o Auxílio Brasil, número que dobrou em 1 mês.

Em abril deste ano, 136.685 famílias cearenses estavam inseridas no CadÚnico, tinham perfil para estar no Programa Auxílio Brasil (PAB) – o Bolsa Família “rebatizado” –, mas ainda não recebiam o benefício. Em março, eram pouco mais de 63 mil famílias nessa situação.

Os dados são de estudo da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), e mostram que o Ceará é o 7º estado do Brasil e 3º do Nordeste com maior demanda reprimida para o Auxílio Brasil, em vigor desde novembro de 2021.

2,8milhões de famílias estão na fila do Auxílio Brasil. A demanda cresce mês a mês, mais acelerada do que a oferta.

O CadÚnico, como explica a CNM, “continua sendo o principal instrumento para a seleção e a inclusão de famílias de baixa renda em programas sociais, sendo usado obrigatoriamente para a concessão de benefícios como o antigo Bolsa Família e o atual Auxílio Brasil”.

“O PAB segue provendo novos acessos, porém em uma velocidade desproporcional à demanda. É importante que o Governo Federal trabalhe com projeção de demanda”, pontua a CNM no estudo.

Garantir essa mínima renda por mês é a principal forma de sobrevivência de milhares de famílias – como a da jovem Sabrina Lima, 25, cujo único rendimento para sustentar a si e ao filho de 5 anos tem sido o Auxílio Brasil.

Desempregada, ela chegou a ter o benefício bloqueado, mas conseguiu retomar o acesso e ainda complementar a ajuda com o Auxílio Gás. A quantia é vital, mas ainda insuficiente diante da alta inflação.

Esse auxílio é quase todo pra pagar aluguel. O que fica é pra pagar água, luz e o que dê pra comprar de alimentação, porque hoje em dia comida tá até difícil, não dá pra comprar muita coisa. Quebra o galho.
SABRINA LIMA
Desempregada

O “sufoco” de Sabrina, que é mãe solo, será amenizado a partir do próximo mês, já que na segunda-feira, dia 18 de julho, voltará ao mercado de trabalho após tempos sem conseguir. “Vai ser um alívio grande.”

POR QUE NÃO HÁ AUXÍLIOS SUFICIENTES?
Num cenário em que o preço de itens básicos e o desemprego aumentam na mesma velocidade, a dificuldade de as vagas do Auxílio Brasil acompanharem a demanda também cresce, como explica André Lima Sousa, professor de Ciências Sociais da Universidade Estadual do Ceará (Uece).

“As famílias vão empobrecendo, então cresce a procura pelo auxílio. Isso se justifica pela corrosão do poder de compra das famílias, sobretudo dos bens mais básicos, como alimentação, gás e transporte”, destaca o professor.

Outra questão é o aumento da fome e da miséria. Com o retorno do Brasil ao mapa da fome: 3 a cada 10 pessoas passam fome no País, isso é muito grave.
ANDRÉ LIMA
Professor da Uece

Ao fim de 2020, 19,1 milhões de brasileiros conviviam com a fome. Em 2022, o número atingiu trágicos 33,1 milhões de pessoas. No Nordeste, 38,4% da população vive em insegurança alimentar moderada ou grave, de acordo com estudo da Rede Penssan.

André Lima lamenta que “às famílias que não conseguem acesso ao Programa Auxílio Brasil, só resta continuar na situação de miséria e fome”, cenário que impacta diversas esferas da sociedade – como saúde e educação.

“Claro que essa política (PAB) vem permeada por diversas dimensões: famílias com gestantes precisam fazer acompanhamento médico para receber o benefício; em famílias com crianças e jovens, eles devem estar matriculados na escola”, exemplifica o professor.

O Diário do Nordeste questionou o Ministério da Cidadania sobre a quantidade insuficiente de vagas do Auxílio Brasil no Ceará, enviando as seguintes perguntas:

Quais os possíveis motivos para a existência dessa demanda reprimida?
O Ministério da Cidadania acompanha a evolução do número de famílias que precisam de assistência?
Quais os critérios para uma família sair dessa "fila" de espera pelo Auxílio Brasil?
Há previsão de ampliação do programa no Ceará?

Até a publicação deste texto, a Pasta não respondeu às questões.

O QUE O CEARÁ PODE FAZER
A reportagem também buscou os governos estadual e municipal de Fortaleza para saber como atuam no cadastramento da população no CadÚnico e se há políticas complementares ao auxílio federal, que assistam a população de baixa renda, sobretudo em extrema pobreza.

1.466.180 famílias do Ceará inseridas no CadÚnico vivem em situação de pobreza e extrema pobreza, segundo dados do Ministério da Cidadania.

Em nota, a Secretaria de Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SDHDS), da prefeitura, detalhou apenas o procedimento que as famílias devem seguir para ingressar no CadÚnico, sem citar nenhuma política pública assistencial complementar à federal.

Já a Secretaria de Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos, do Governo do Estado, citou 4 "políticas públicas estaduais voltadas à população em situação de vulnerabilidade: Vale Gás Social; Mais Nutrição (doação de alimentos); Cartão Mais Infância Ceará (transferência de renda); e AvanCE (bolsas estudantis).

A Pasta destacou ainda que "presta orientação técnica aos municípios sobre a gestão do CadÚnico, estimula o cadastramento, faz as articulações necessárias com os governos federal e municipais, e articula estratégias de qualificação da base de dados".

Fonte: Diário do Nordeste

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