Cariri. Do rancho modesto nas imediações da Basílica Santuário, um caminhão carregado de romeiros, das mais diversas faixas-etárias, parte em direção ao Horto. Antes, uma Ave-Maria para que viagem seja boa. A buzina estridente sinaliza a “penitência da romaria” nas palavras da alagoana Margarida Paixão dos Santos, de 65 anos.
O luxo da fé simples da aposentada Maria Enelde Feitosa, de 76 anos, que pôs na cabeça um chapéu preso a um elástico branco, adentra ao pau-de-arara com bancos de tábuas, sem forro. No teto, apenas uma lona cinzenta protege das intempéries. O esforço de Dona Maria Enelde não é sem motivo: “render graça a meu Padim Ciço e à Mãe das Dores”. Preces em forma de canções. Benditos. Livres. Libertadores.
Ao chegar ao Horto, os romeiros depositam, com os olhos, as preces, as lágrimas e as súplicas trazidas no coração. O caminho tão longo, cheio de pedra e areia do aposentado Benildo Alves de Oliveira, de 69 anos, que viajara 570 km, é amenizado pela “luminura” da Mãe de Deus das Candeias. Elevando os olhos para o céu, cruzando as mãos e apertando-as contra o peito, solta grande suspiro e diz: “Tem um mistério na peregrinação”. Uma vez, ele conta, quando em época de romaria, ousou desafiar uma sonda, consequência de um problema delicado, para fazer o percurso ao Juazeiro. Caminhando com dificuldade, “arriando” aqui e ali, as pessoas faziam olhar de admiração e o paravam entre uma rua e outra:
– De onde o senhor vem nessa situação? O senhor é um homem de Deus. Eu posso tocar no senhor?
– Não só tocar, mas abraçar também – Ele brinca, galante. – Isso foi minha cura. Benildo ainda lembra que, após a viagem, soube do médico que não precisaria mais ser submetido à cirurgia. Apenas ia tomar uns poucos remédios. Baixando a vista, busca na memória outro episódio em que fora “alumiado” pela Mãe das Candeias:
– Daqui só sai no ônibus! – Ele imita o tom sisudo com que o guarda lhe falara numa ocasião em que a comitiva de romeiros tivera de ser barrada pela Polícia Rodoviária Federal. Entre uma conversa e outra, justificando os motivos da viagem em pau-de-arara, conseguiu convencê-lo. O episódio, ainda hoje, é lembrado com bom humor:
– Com guarda ou sem guarda, eu to aqui em Juazeiro!
Quer venham de caminhão, de ônibus, vã ou topique, Seu Benildo, Dona Enelde e tantos outros romeiros não medem esforços para chegar à terra daquele que tomaram como “padim”. E mesmo desconhecendo a rigidez dos ritos, a fé que professam, de tão simples, os levam a conhecer, de forma profunda, os desígnios de Deus. “Graças te dou, ó Pai, Senhor dos céus e da terra, pois escondeste estas coisas dos sábios e cultos, e as revelaste aos pequeninos…”           (Diocese de Crato)

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