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Imagem: Lucas
Seixas - 28.ago.2019/Folhapress
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Uma nova
onda de ataques feitos por uma facção criminosa no Ceará tem afetado a
rotina da população e a sensação de segurança no
estado desde o último sábado (21). Neste ano, já é a segunda vez que isso
acontece em razão de mudanças no sistema penitenciário.
Em
sua primeira entrevista a um veículo nacional após os crimes, o governador
Camilo Santana pede que haja uma legislação mais rigorosa contra o terrorismo, o que, por vezes,
esbarra no posicionamento de seu partido, o PT.
Santana
também defende que o governo federal atue mais fortemente nas áreas de
fronteira. "Todo esse problema da violência no país é devido a um fator:
droga, tráfico de droga. Se você for olhar, a responsabilidade de combater o
narcotráfico é da União, não é dos estados", disse ao UOL em
entrevista por telefone.
No
sábado, começaram ataques a ônibus, carros, caminhões e edificações, que
foram incendiados.
Eles foram registrados na capital, Fortaleza, e em outras cidades, como
Canindé, Quixadá, Quixeramobim, Paracuru e Jucás. As ações criminosas teriam
sido ordenadas pelo GDE (Guardiões do Estado), facção que rivaliza com o PCC
(Primeiro Comando da Capital) e reclama de mudanças nos regimes nos presídios
estaduais.
Santana
qualifica como terrorismo os atos ocorridos no estado e pede uma punição mais
dura a que quem seja flagrado cometendo o crime, o que demandaria uma alteração
na legislação. Também colocaria o governador em rota de colisão com seu
partido. O PT e outras siglas já se posicionaram contra modificações na lei que
tipifica o terrorismo com o receio de que elas atinjam ativistas ou movimentos
sociais.
No
ano passado, o então senador Lindbergh Farias (PT-RJ), por exemplo, chamou o
projeto de tentativa de criminalizar o MST: "Em cima desse texto, podem
prender militantes de movimentos estudantis, movimentos sindicais, estamos
criminalizando o MST".
A legislação aponta ser classificado como terrorismo os
atos ligados a "xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor,
etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social
ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, paz pública ou
incolumidade pública".
Desde
2016, um projeto no Senado tenta incluir nela pontos como:
"incendiar,
depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem
público ou privado, com o objetivo de forçar a autoridade pública a praticar
ato, abster-se de o praticar ou a tolerar que se pratique, ou ainda intimidar
certas pessoas, grupos de pessoas ou a população em geral"
"interferir,
sabotar ou danificar sistemas de informática ou bancos de dados, com motivação
política ou ideológica, com o fim de desorientar, desembaraçar, dificultar ou
obstar seu funcionamento".
O
tema está na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado. No início de seu
mandato, o presidente Jair
Bolsonaro (PSL) já se mostrou a favor desse projeto.
Esses itens haviam
sido vetados, há três anos, pela então presidente Dilma Rousseff
(PT) por pressão do partido e de movimentos sociais.
É
preciso "que essas ações sejam consideradas, tipificadas como
terrorismo", disse o governador. "Você jogar uma bomba, jogar um
coquetel molotov hoje, não tem uma pena... Tanto que, às vezes, pessoas que
cometem esse crime pouco tempo depois estão soltas."
Para
Santana, uma legislação mais dura poderia "intimidar esse tipo de ação
covarde". "Tipificá-la como terrorismo garante que as pessoas estarão
presas e punidas de forma mais rigorosa", afirmou.
“Muitas
pessoas do meu partido ou da esquerda acham que isso pode punir algumas
questões de movimentos sociais. Acho equivocada essa interpretação”
Camilo Santana (PT), governador do Ceará
Camilo Santana (PT), governador do Ceará
Responsabilidade
da União
O
governador, porém, também espera uma atuação mais forte do governo federal no
combate ao tráfico de drogas. "A droga entra pelas fronteiras do Brasil.
De quem é a responsabilidade de proteger as fronteiras? Da União. Não é dos
estados", comentou. "Ninguém vai conseguir enfrentar o problema da
violência se não houver uma pactuação nacional. Essa é uma questão
interfederativa, onde cada um cumpre seu papel, suas responsabilidades."
Para
o político, o crime "ultrapassou os limites dos estados".
Santana
também comentou o fato de advogados
terem sido presos nos últimos dias. Para evitar que eles façam a
comunicação com criminosos que estejam fora dos presídios, os detentos passam
por revista após os encontros, e não os advogados. "Uma série de medidas
que a gente vem tomando para evitar essa transferência de qualquer tipo de
comunicação, de qualquer tipo de material que entre no presídio",
comentou.
"Ninguém
consegue resolver esse problema de uma vez por todas. Isso é um processo",
avalia Santana, que vê na criação do Susp (Sistema Único de Segurança Pública),
no ano passado, como um primeiro passo. "O que está faltando um pouco é
mais a operacionalização."
O
governador está em contato com o ministro da Justiça, Sergio Moro.
O ex-juiz da Operação Lava
Jato já liberou vagas em presídios federais para a
transferência de detentos que estão no sistema estadual e tenham ligação com a
facção. Ainda não foi debatida a ideia de envio da Força Nacional de Segurança,
segundo Santana.
Para
o petista, as transferências são importantes. "Você desarticula o contato,
desestrutura de certa forma", disse Santana.
"Em
janeiro, tínhamos todas as facções aqui juntas. O sistema prisional ainda
estava desestruturado. É apenas uma facção. Temos conseguido dar respostas
rápidas", falou. "A partir do momento que eu sentir que haja
necessidade de conversar com o presidente [Jair Bolsonaro, para pedir a
presença de tropas federais], eu serei o primeiro a ligar para ele e colocar a
necessidade, como fiz em janeiro."
O
governador diz que sua gestão tem feito tudo que está ao alcance para lidar com
os ataques, que seriam uma tentativa de intimidar o estado. "Novas
lideranças estão tentando demonstrar força", diz.
Foram
mais de 50 prisões efetuadas nos últimos dias, com quase 40 crimes registrados.
Ao menos dez lideranças criminosas foram identificadas e serão transferidas
para presídios federais. O governo já transferiu
mais de 250 presos para outras unidades prisionais no estado.
Questionado
sobre que certeza poderia dar aos cidadãos de que não haverá outra onda, ele
disse que a garantia que pode oferecer é a de que vai continuar com "um
trabalho duro, rigoroso, com combate ao crime organizado no estado".
"É claro que isso é um processo." (UOL Notícias)
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