Para especialista, a interrupção das aulas presenciais devido à Covid-19 deveria promover o redirecionamento de recursos para a garantia de estratégias de conectividade para alunos e professores. Foto: Camila Lima

Em 2020, o Ceará gastou 10,5% menos com educação do que no ano anterior, o que representou uma baixa de R$ 361 milhões no orçamento. A diminuição das despesas com educação, porém, aconteceu em quase todos os Estados do Brasil. No primeiro ano da pandemia de Covid-19, apenas Rondônia conseguiu investir na área pouco mais do que tinha investido em 2019. 

O levantamento consta na 10ª edição do Anuário Brasileiro da Educação Básica, construído pelo movimento nacional Todos pela Educação e divulgado na última terça-feira (3). A Educação Básica abrange as etapas de ensino da creche ao Ensino Médio.

De acordo com o documento, o estado que menos direcionou recursos para a educação básica no ano passado, em relação a 2019, foi Goiás (-38,1%), seguido de Piauí (-23,3%), Rio de Janeiro (-20,4%), Pernambuco (-14,3%) e Mato Grosso do Sul (-13,9%).

"A pandemia não deveria ser justificativa. Muitos países ampliaram os gastos em educação mesmo com escolas fechadas. Isso varia nos estados, mas nem sempre a educação é prioridade. No ano de pandemia, o Ministério da Educação teve seu menor orçamento da década, o que é muito grave."
GABRIEL CORRÊA
Líder de políticas educacionais do Todos pela Educação

O especialista explica que, com a interrupção das aulas presenciais, os recursos deveriam se voltar para garantir estratégias de conectividade e plataformas on-line, bem como para ajustes de infraestrutura para o retorno presencial seguro.

MENOS DESPESAS
No capítulo que relaciona os dados do anuário à Covid-19, o Todos pela Educação descreve que, em “ambientes de crise econômica e queda de arrecadação, não faltam propostas de flexibilização de despesas obrigatórias e artifícios para mudar o destino dos recursos”, o que levou praticamente todo o País a precisar diminuir significativamente os investimentos em educação.

Em nota, a Secretaria da Educação do Ceará (Seduc) esclarece que é responsável apenas pela oferta do Ensino Médio nas escolas estaduais, enquanto o estudo do Todos Pela Educação abrange toda a rede pública que oferta os níveis de educação básica, incluindo os municipais. “Portanto, os apontamentos não condizem com o aplicado na rede estadual”, diz.

A pasta confirma que, por causa do isolamento social e do não atendimento presencial nas escolas estaduais, “houve sensível redução de despesas com transporte escolar e contas públicas”.

“Ainda assim, a Educação Estadual dispôs no ano de 2019 do equivalente a 26,18% da receita líquida do Ceará. Em 2020, esse percentual chegou a 27,10%, demostrando aplicação proporcional maior por parte do governo estadual na área”, afirma a Seduc, sem mencionar valores absolutos.

CAPITAL EM DESTAQUE
Dentre as capitais brasileiras avaliadas pelo levantamento, Fortaleza se destacou como uma das seis que conseguiram ampliar o investimento aplicado em 2019, saindo de um total de R$ 1.546 milhão para R$ 1.557 milhão, num acréscimo de 0,7% ao orçamento.

A Secretaria Municipal de Educação de Fortaleza (SME) foi procurada para comentar os dados da pesquisa mas não respondeu até o fechamento da matéria.

RECURSOS 
Por outro lado, as despesas com a educação básica diminuíram no Ministério da Educação, que concentra os recursos na área. Segundo o relatório nacional, o valor pago pelo Governo Federal aos estados e municípios caiu 11% entre 2019 e 2020, saindo de R$ 36,5 milhões para R$ 32,5 milhões.

Para o professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e especialista em educação, Enéas Arrais Neto, a diminuição de verbas para a educação antecede a pandemia. Ele lembra que, nas discussões que montaram o Plano Nacional de Educação (PNE), em 2010, se previa que, em 2020, o Brasil tivesse subido para pelo menos 10% do Produto Interno Bruto (PIB) o percentual destinado à educação. Porém, atualmente, no País, ainda são destinados somente 6%.

O especialista destaca ainda que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55, aprovada em 2016 pelo governo Michel Temer (MDB), contradiz o PNE quando congela os gastos públicos com educação. "Como tem um plano que decide quase duplicar o percentual da educação no orçamento federal e tem uma lei que impede isso?", provoca.

A necessidade de investimento, segundo Arrais Neto, se justifica na urgência em aumentar as estruturas físicas da educação pública, uma vez que a universalização dos ensinos infantil, fundamental e médio requer a abertura de novas matrículas e escolas.

"A gente precisa ainda duplicar a estrutura pública que tem e isso ainda não seria suficiente de dar conta de tudo", dimensiona. E mesmo no Ceará, onde ele reconhece que foram feitos investimentos consideráveis em construção de escolas de educação profissional.  

Gabriel Corrêa, do Todos pela Educação, ressalta também que o Ceará continua sendo destaque na área em relação ao Brasil, “mas não pode se dar por satisfeito”. “É preciso melhorar a infraestrutura, a gestão, desenvolver as competências dos estudantes. E para evoluir, se precisa gastar mais em educação, ampliar o investimento por aluno”, defende.

Fonte: Diário do Nordeste

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