Foto: Natinho Rodrigues

12/11/2023

Diante dos efeitos do El Niño, fenômeno climático que diminui a possibilidade de precipitação na Região Nordeste, cientistas e pesquisadores fazem alertas preocupantes para o Estado do Ceará. Segundo destacou Carlos Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), à reportagem, o interior cearense pode virar um “semideserto” devido às mudanças climáticas abruptas que vêm sendo observadas. “Muita parte, não a zona costeira, vai se tornar semidesértica. A Amazônia pode desaparecer e a Caatinga também vai praticamente desaparecer”.

O El Niño atua por meio do aquecimento das águas do Oceano Pacífico, a oeste do Brasil. O efeito tem consequência no nível de precipitação sobre o território brasileiro, afetando o Nordeste com a diminuição do volume das chuvas. Ainda de acordo com Carlos Nobre, além do fenômeno climático que afeta a temperatura do Pacífico, outro fator também influencia no volume das precipitações. “Quando o Oceano Atlântico tropical ao norte do Equador está muito quente, a estação chuvosa vem em um fenômeno meteorológico que se chama Zona de Transferência Intertropical, em que a chuva não desce muito, há seca”, explicou.

Em 2023, o volume de chuva deve ultrapassar o valor médio anual esperado pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), mas existe preocupação para os anos seguintes. Conforme Eduardo Sávio Rodrigues, presidente da Fundação, “as notícias não são boas para as famílias do campo”. A projeção de Carlos Nobre também não é otimista. Segundo ele, a expectativa é que o El Niño continue até “meados de 2024”. “O semiárido tem que estar muito preparado para uma seca intensa”, ressalta.

Como afirmou Carlos Nobre, a temperatura vem sofrendo aumentos constantes. Até o ano passado, segundo ele, houve um acréscimo de 1,15° C em relação ao final do Século XIX. A preocupação para este e os próximos anos é ainda maior. “Neste ano, estamos batendo o recorde de aumento de temperatura. Atingiremos 1,3° C, e o limite do Acordo de Paris, de 1,5° C, nós vamos atingir até 2033 ou 2034 se continuarmos aumentando as emissões dos gases de efeito estufa”.

“Com 1,2° C ou 1,3° C, já aumentaram demais os efeitos extremos, como ondas de calor, chuvas extremas e secas. Imagina se nós passarmos muito [no aumento de temperatura]. É muito importante realmente reduzirmos as emissões dos gases de efeito estufa”.

VOLUME DAS PRECIPITAÇÕES NO CEARÁ POR ANO

Conforme dados da Funceme, o último El Niño que afetou intensamente o volume de chuvas no Ceará foi em 2012. No ano, o volume anual médio de chuva observado foi de 363.8 mm, uma redução de 54,6% da quantia média normal para os 12 meses do ano, de 800.6 mm. À época, as baixas no nível de precipitações duraram mais seis anos, até 2018.

Desde o começo do século, em 23 anos, o volume de chuva foi menor do que a média normal esperada em 13 deles. Para 2024, a expectativa é de que tenhamos outro ano com volume médio menor de precipitações. Confira o levantamento desde 2001:

2001 – 577.9 (-27,8%);
2002 – 820.4 (+2,5%);
2003 – 837.9 (+4,7%);
2004 – 1041.8 (+30,1%);
2005 – 588.1 (-26,5%);
2006 – 760.8 (-5%);
2007 – 670.8 (-16,2%);
2008 – 925.5 (+15,6%);
2009 – 1218.5 (+52,2%);
2010 – 537.6 (-32,8%);
2011 – 997.6 (+24,6%);
2012 – 363.8 (-54,6);
2013 – 548.7 (-31,5%);
2014 – 548.3 (-31,5%);
2015 – 523.3 (-34,6%);
2016 – 551.3 (-31,1%);
2017 – 668.2 (-16,5%);
2018 – 799.1 (-0,2%);
2019 – 843.8 (+5,4%);
2020 – 961 (+20%);
2021 – 692 (-13,6%);
2022 – 1010 (+26,2%);
2023 – 800.1 (-0,1% – até agora).

NÚMERO DE QUEIMADAS PREOCUPA

Uma das consequências da diminuição do volume de chuvas são as queimadas. O último quadrimestre – setembro, outubro, novembro e dezembro – costuma ser o período em que mais há a ocorrência de queimadas, devido à diminuição de precipitações e intensificação da seca. Segundo o Corpo de Bombeiros Militares do Estado do Ceará (CBMCE), foram 5.603 ocorrências no Estado nos primeiros 10 meses de 2023. Ainda conforme o órgão de segurança pública, houve um crescimento no número de ocorrências de 46,82% em relação ao mesmo período no ano passado.

Do total, 1.757 incêndios foram registrados apenas em setembro, sendo o mês com mais atendimentos deste tipo nos últimos cinco anos. De acordo com o CBMCE, o número de ocorrências até outubro, neste ano, já ultrapassou o de 2022 por inteiro.

Os dados do Corpo de Bombeiros são registrados de acordo com as denúncias feitas pela população. Um outro levantamento, do Inpe, mostra um total de 3.492 incêndios no Ceará. A pesquisa do Instituto analisa imagens de satélite. Segundo o órgão, o mês de setembro, por exemplo, teve 638 queimadas registradas no Estado, sendo o segundo da série histórica desde 1998 com mais queimadas no nono mês do ano, perdendo apenas para 2001, com 808. Outubro de 2023 apresentou o terceiro maior dado da série histórica, com 1969 registros de queimada, atrás apenas de 2003 (2465) e 2001 (2051). Em novembro, ainda no primeiro terço do mês, já foram registradas 340 queimadas no Estado.

Fonte: Opinião CE

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