Alunos da Escola Lourenço de Lira participam do projeto do reúso de água. FOTO: Marcelino Júnior |
Santana
do Acaraú.
Todos os dias, Ana Letícia Lopes, estudante do 6º ano da Escola Lourenço José
de Lira, localizada no Assentamento Alvaçan/Goiabeiras, no Município de Santana
do Acaraú, se sentia incomodada com a lama que se acumulava num determinado
local da escola. A água fétida, que ocupava bastante espaço e servia de
proliferação de insetos, era resultado da lavagem de louça da cozinha, do
bebedouro e da utilização das torneiras dos banheiros.
Apesar
das reclamações, o problema continuou sem solução até que um projeto foi posto
em prática, resolvendo, não apenas a questão da destinação correta de toda
aquela água estagnada a céu aberto, como também a potencialização de tudo que é
produzido na horta, criada pelos próprios alunos para ajudar na elaboração da
merenda escolar.
Implantado
em janeiro deste ano, o Projeto de Reúso de Água mudou a relação de Ana Letícia
com a água encanada que circula na escola para atender os 210 alunos, desde o
Ensino Infantil III ao 9º Ano. De acordo com a estudante, "isso representa
diminuição no desperdício. Antes, toda essa água se perdia, escorrendo por um cano
até ser despejada de qualquer forma, ocupando até um pequeno espaço onde os
alunos costumavam brincar. Agora, ela é reaproveitada.
"O
assunto já foi tema de trabalhos apresentados em várias turmas, que falaram
sobre a relação da nossa comunidade com o meio ambiente e a utilização
consciente da água que falta em alguns períodos de seca", lamenta a
estudante, que acompanhou de perto a construção da pequena estação de
reutilização de água, localizada a cerca de 15 quilômetros da sede do
Município. A instalação da estação de reúso foi possível com apoio da Esplar,
uma organização não governamental (ONG), sem fins lucrativos, fundada em 1974,
com sede na cidade de Fortaleza.
A
organização atua diretamente em municípios do Semiárido cearense, como Santana
do Acaraú, que mantém sua economia, em parte pelo contracheque do funcionalismo
público e a agricultura familiar.
A
ONG trabalha com o desenvolvendo atividades voltadas a agroecologia e o serviço
da agricultura familiar, além de realizar trabalhos nas áreas de fortalecimento
das organizações de trabalhadores rurais para acesso a políticas públicas
voltadas ao setor da agricultura familiar; justiça ambiental e qualidade de
vida, a partir do direito à terra, à água e à biodiversidade; o desenvolvimento
de sistemas agroecológicos; além do processamento e comercialização da produção
agrícola na perspectiva da sócio-economia solidária.
Sustentabilidade
Na
prática, são utilizados canos de PVC de tamanhos e espessuras variados,
manilhas, telhas e madeira. Após sua utilização, a água é direcionada por canos
até duas caixas coletoras, instaladas a poucos metros do prédio, que retém
grande parte da gordura. Em seguida, o líquido passa para um filtro, contendo
várias camadas de pedra, areia e brita, onde ocorre o processo de decantação. O
material segue para outro reservatório. Dessa vez, com ajuda de uma bomba, a
água limpa é direcionada para a horta, a poucos metros dali. Ao lado das
manilhas, foi instalado um minhocário, com cerca de meio quilo desses animais.
Toda
gordura acumulada nas caixas coletoras é aproveitada. A cada quinze dias, o
material é lançado no tanque de minhocas, sendo misturado a esterco de animais,
palha de carnaubeiras e pó de madeira. Os bichos entram em ação transformando
todo o material em húmus, matéria orgânica produzida também pela decomposição
de animais e plantas mortas. O resultado final será transformado em adubo,
também utilizado na manutenção das frutas e hortaliças que servem à merenda.
Além
de Santana do Acaraú, a Esplar instalou a mesma estrutura no Município de
Quixadá, no Sertão Central. Segundo Mardônio Martins de Sousa, técnico
agropecuário da ONG, o projeto de Bio Água segue alguns requisitos para ser
instalado nas comunidades. "Essa tecnologia de reutilização da chamada
água cinza, aquela de pias e ralos, ajuda muito na questão da sustentabilidade
das famílias rurais", explica o técnico agropecuário e finaliza. "Os
requisitos para a instalação se baseiam na avaliação do consumo médio de água
de determinada família ou escola, núcleos onde o projeto normalmente se dá. As
áreas mínima máxima para instalação variam de 200 m² e 400 m²".
De
acordo com Ana Valdênia Carneiro, uma das professoras mais antigas da escola,
as mudanças ocorreram, tanto no aumento da conscientização de funcionários e
alunos sobre a relação com o meio ambiente, como a economia conseguida por meio
do Projeto.
Economia
"Em
agosto último, período em que a água é mais escassa na região, nosso consumo
chegou a R$ 400. Tínhamos que fazer algo para diminuir esse gasto. Após trabalho
educativo com os alunos, o Esplar entrou com a instalação, no fim de dezembro,
da estrutura de reaproveitamento. Apesar de efetivado em 29 de janeiro, já
contamos com uma economia de cerca de 15% nos custos com água", afirma
Ana.
Para
a diretora Rosângela Sousa de Queiroz, "essa conscientização sobre
economia de água, também se estende à comunidade. Esse será o tema debatido em
nosso projeto de Meio Ambiente Infantojuvenil a ser apresentado ainda este
mês".
O
assentamento Alvaçan/Goiabeiras, criado em 1987, conta com 67 famílias
cadastradas e outras 76 agregadas. A comunidade, que tem no cultivo do milho,
feijão e macaxeira, a base de sua subsistência, sofre os efeitos da falta de
chuvas nos períodos de acentuada escassez que recaem sobre o Ceará a cada ano.
Segundo
o agricultor Francisco Edmilson Lira, um dos colaboradores para a instalação do
equipamento de reutilização da água, "sendo bem cuidada, essa estrutura
terá vida longa. A captação e redirecionamento trouxeram outros benefícios,
como o combate à dengue e o aumento de outras doenças geradas pelo acúmulo de
lama".
Fique
por dentro
Em
2018, trinta equipamentos serão instalados
Este
ano, a Esplar pretende instalar mais 30 equipamentos de reutilização de água na
zona rural de municípios cearenses. A estrutura atende escolas e famílias com
uma média de três pessoas. Para se obter resultados significativos, o consumo
médio de água deve variar entre 180 e 200 litros, por dia, ou, no máximo, de
500 litros diários.
Enquete
Qual
a importância do evento?
"
O bom do projeto é que ele transforma toda a água, que antes iria para o
esgoto, em algo quer pode ser utilizado novamente. Antes, a água que saia da
cozinha ficava empoçada, criando até mau cheiro"
Francisco
Liedson Gomes. Estudante
"O
importante é a economia de água. A estação de reaproveitamento evita o
desperdício trazendo benefícios para todos. O exemplo é a nossa horta, que
reutiliza o que antes era despejado a céu aberto"
Ana
Gizele de Lima. Estudante
(Diário do Nordeste)
Postar um comentário