Você desbloqueia o
celular, frequentemente, para conferir se há mensagens, recados,
e-mails novos? Tem a impressão de que o celular vibrou quando
está no bolso e quando vai conferir não há nada? Perde a noção do que
está acontecendo em volta quando está concentrado na tela do
smartphone? Confere o celular quando
acorda, quando vai dormir e até no trânsito?
Se
a resposta é positiva para qualquer uma das perguntas, é possível que
você esteja usando o celular de forma disfuncional e já seja
um dependente virtual.
Todas
as sentenças acima se referem a novos diagnósticos clínicos de uso abusivo de
smartphones.
A
dependência tem vários níveis: vai da falta de educação digital, que
inclui a dificuldade de equilíbrio sobre o tempo e locais de uso, até
o nível patológico. segundo a psicóloga Anna
Lucia Spear King, doutora em saúde mental do Delete, núcleo especializado
em Detox Digital, na
UFRJ.
"Efeito
Google", "Depressão do Facebook" e "Invisibilidade
Social" são novos diagnósticos clínicos
Os
pesquisadores do Instituto Delete diagnosticaram diversos transtornos
relacionados, além da nomofobia em si. Existe o “Efeito Google”,
que acontece quando o cérebro humano começa a segurar menos informações
porque sabe que vai obter respostas com poucos cliques. Outro
transtorno é o de “Invisibilidade Social”, que ocorre quando a pessoa
negligencia o que está em sua volta por estar concentrada na tela do
dispositivo.
Tem
ainda a “Síndrome do Toque Fantasma”, que é quando o cérebro faz com que você
pense que o celular está vibrando no bolso, quando não está. O Instituto
Delete também mapeou a “Depressão do Facebook”, causada pela comunicação
na rede social.
“As
pessoas vão para as redes sociais quando têm depressão pra
se sentirem menos deprimidas, se sentirem participando, inseridas em algum
contexto ou não se sentirem só. Mas, ao menos tempo, elas podem
se sentir mais deprimidas se acreditarem em tudo o que é postado porque nas
redes sociais, as pessoas só postam o melhor”, explica a
pesquisadora do Delete.
Somos
mal-educados digitalmente?
“As
pessoas que têm esse uso excessivo diário, na verdade, são mal-educadas
digitalmente, não sabem usar a tecnologia no dia a dia dando limites. Elas
usam no teatro, no cinema, elas usam em companhia de outras pessoas, elas usam
até em velório para tirar selfie com o morto, ao fundo”,
relata Spear.
As
cenas, por mais exageradas que possam parecer, são reais e cada vez mais
comuns. A balconista Liana Araújo, por exemplo, confessa que não
larga o aparelho:
“Não
tem como ficar sem, já é um vício. Às vezes, a gente se comunica até em
casa. Por exemplo: estou no quarto; minha irmã, na cozinha. Ao
invés de falar, mando mensagem.”
A
irmã, Lívia Maria, de 14 anos, confirma a história. "Vamos supor que
ela quer um suco, um pão. Aí ela manda a mensagem: ‘Lívia, faz isso pra
mim’. Aí eu vou lá e faço”.
Depressão
e ansiedade são agravadas com a dependência digital; sono é outro transtorno
Quando o
uso do celular se torna desequilibrado e começa a afetar
efetivamente áreas do cotidiano, é possível que a dependência esteja
evoluindo. A psiquiatra Tatiana Pinho, do ambulatório de Psiquiatria
Geral do Hospital Universitário
Walter Cantídio explica que o vício patológico se
manifesta “quando existe um descontrole nesse uso”.
Esse uso
acaba interferindo em diversas esferas. “O tempo vai passando e
a pessoa perde a percepção disso e deixa de fazer coisas que poderiam ser
importantes como estudo, trabalho, contato com os amigos, com a família”,
afirma Tatiana. E, geralmente, começam a
surgir consequências práticas. “Fim de relacionamento, problemas com
filhos, perda de emprego, problema em relação a estudo, a dificuldade de
concentração em torno do celular”, esclarece.
A
psicóloga Tamara Maia, que atende pacientes na rede particular de Fortaleza,
explica que o “vício na internet ou nas tecnologias de forma geral é
comparado a outros tipos de vício, por exemplo, o vício de compulsividade alimentar ou
em drogas”. Ela
explica que “é algo que é prazeroso naquele momento mas que,
realmente, cria uma relação de dependência e nenhuma relação de
dependência é positiva”, afirma.
A
estagiária de pedagogia Artemmisia Oliveira conta que já sofreu
muitos prejuízos na rotina em razão do uso excessivo de celular. Por causa do
filho pequeno, evitava pegar o aparelho de dia. Mas
à noite, abusava.
“Ficava
no celular até duas e meia da madrugada, três, assistindo filme,
respondendo às pessoas,
olhando Instagram, Facebook, e isso atrapalhava muito
a minha rotina, meu sono.”
E
mesmo depois de já ter desligado o celular pra
dormir, Artemmisia voltava a checar a tela. “Se eu fosse
pro banheiro, na volta, eu tinha que dar aquela conferida, pra ver se não
tinha mensagem, alguma coisa", conta. “No outro dia, estava esgotada”.
A
insônia é uma das consequências possíveis geradas pelo uso abusivo do
celular. Mas há outras. A psicóloga do Delete, Anna
Lucia Spears, explica que a dependência é patológica quando está
associada a algum transtorno mental, como ansiedade, depressão, compulsão,
transtorno do pânico que potencializam o uso das telas.
“Muita
gente passa a viver a realidade da internet, então, passa o dia todo com a
necessidade de checar, tirar fotos, conferir curtidas. A pessoa passa a
viver muito presa em torno disso, o que pode acarretar ou agravar quadros já
existentes de depressão e de ansiedade”, explica a psicóloga Tatiana
Pinho, do HUWC. (Diário do
Nordeste)
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