11/12/2023
O Poder Judiciário condenou o Estado do Ceará e o proprietário de um balneário no município de Cruz a indenizar a família de um estudante do terceiro ano do Ensino Médio de uma escola pública que se afogou durante excursão ao tentar salvar a vida de um colega. O processo, de relatoria da desembargadora Maria Nailde Pinheiro Nogueira, foi julgado pela 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE).
Segundo os autos, em dezembro de 2015 a Escola Estadual Theolina de Murylo Zacas, localizada em uma comunidade rural de Bela Cruz, organizou uma excursão para um balneário na Lagoa da Prata, em Cruz. Todos os alunos foram conduzidos pela própria instituição de ensino, sob a responsabilidade de apenas um professor.
O jovem estava se divertindo na água com outros dois amigos. Porém, deixou o local na companhia de um deles, enquanto o outro permaneceu no açude. Quando perceberam que o colega estava se afogando, os dois estudantes voltaram para ajudar, buscando, inclusive, uma canoa para o resgate. De acordo com os autos, neste momento, o professor estava cuidando dos detalhes do almoço da turma.
O rapaz alcançou o jovem que se afogava e o ajudou a manter a cabeça fora da água. Após ouvir gritos de um pescador, o professor também entrou no local, retirou o estudante que estava em apuros e o levou para o hospital, deixando, no entanto, o outro aluno ainda na água. O jovem se afogou no mesmo local e faleceu.
A família do estudante só soube da morte cerca de duas horas após o afogamento e foi até o lugar para recuperar o corpo do filho. Os pais alegam que a escola não prestou qualquer tipo de assistência diante do ocorrido e, inconformados com o falecimento do garoto, procuraram a Justiça para pleitear uma indenização por danos morais, bem como uma pensão.
O proprietário do balneário contestou, alegando que foi surpreendido pela chegada dos estudantes no dia da excursão, pois a escola não havia comunicado previamente sobre o momento de lazer. Além disso, o homem afirmou que os jovens não pretendiam somente banhar-se no ambiente, mas sim atravessar o Açude da Prata, que é público e de responsabilidade do Município, para chegar a uma ilha que se distancia da margem por alguns metros.
O Estado do Ceará, por sua vez, argumentou não ser o responsável pelos danos causados e disse que não era possível atribuir culpa por um ato que foi praticado pela própria vítima, uma vez que o jovem faleceu tentando ajudar um amigo. Além disso, a defesa sustentou que, por serem os únicos na água no momento do afogamento, os estudantes não teriam recebido autorização para o banho e, mesmo que a tivessem, a distância entre a margem e o local do acidente indicava que os próprios alunos haviam se colocado em situação de perigo.
Em maio de 2022, a Vara Única da Comarca de Cruz entendeu que o proprietário do balneário poderia ser responsabilizado pelo caso, uma vez que explora economicamente o açude onde ocorreram os fatos. Ainda pontuou que é dever do Estado zelar pela integridade física do cidadão e que a morte do adolescente aconteceu porque a vigilância estatal não foi exercida de maneira adequada.
Desse modo, tanto o ente público quanto o dono do local foram condenados ao pagamento de R$ 50 mil por danos morais e de pensão mensal aos pais da vítima no valor de 2/3 do salário-mínimo até os seus 25 anos, reduzindo-se, a partir daí, a 1/3 do salário-mínimo até a data em que completaria 65 anos. Além disso, ficaram sob a responsabilidade dos réus as despesas do funeral, no valor de R$ 2 mil.
O Estado, então, entrou com recurso de apelação no TJCE (nº 0003347-78.2017.8.06.0074), reiterando que não haveria responsabilidade estatal a menos que discriminada a culpa do ente público na prestação da guarda do aluno, o que não teria sido provado. O proprietário do balneário também apelou, sustentando que não poderia ser responsabilizado por ato negligente e imperícia de quem deveria proteger os seus estudantes em horário escolar.
No último dia 29 de novembro, a 2ª Câmara de Direito Público desconsiderou as alegações do proprietário sobre ser parte ilegítima no processo e destacou também a responsabilidade do Estado pela morte.
“Enviar vinte e oito adolescentes para um açude sem verificar se o local dispunha da devida segurança, não os avisar dos riscos de afogamento, não promover a necessária supervisão ou segurança mostra o total desleixo com que os discentes foram tratados, caracterizando clara omissão”, destacou a relatora. Para a magistrada, ficou “caracterizada a responsabilidade objetiva do ente público”.
A desembargadora votou pela manutenção da sentença de 1º Grau e foi acompanhada pelo colegiado. Ao todo, foram julgados 168 processos na sessão.
Integram a 2ªCâmara de Direito Público os desembargadores Maria Nailde Pinheiro Nogueira, Francisco Gladyson Pontes, Maria Iraneide Moura Silva, Luiz Evaldo Gonçalves Leite e Tereze Neumann Duarte Chaves (presidente). Os trabalhos são secretariados pela servidora Ismênia Nogueira Alencar Bitencourt.
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